Vida De Mulher

Para contar histórias das vidas de mulheres, ninguém melhor que uma mulher. Assim é por aqui.

O cachorrinho

A Cat namorava com o Hugo. Ninguém gostava muito do Hugo e a Cat não percebia porquê. Ele era meigo, ternurento, falava baixo, tinha uma postura quase de cachorrinho atormentado.

Mas um dia, aquilo entre a Cat e o Hugo acabou.
A Cat diz que lhe deu um "vipe" e que acabou com ele.
Dizia a Cat:
- Eu sempre disse à minha mãe que, se quiseres saber como uma pessoa realmente é, basta fazê-la zangar. E eu fiz zangar o Hugo.

Durante semanas, o Hugo fez com que a Cat achasse que acabar com ele tinha sido uma atitude impensada; ele chegou a encontrar-se com ela, depois de tudo acabado, só para lhe perguntar se estava arrependida. E ela disse-lhe que sim, que estava muito arrependida.

A verdade foi muito diferente do que aparentava ser.
Durante mais semanas, a Cat chorou o fim daquela relação, chorou no colo dele, enquanto ele lhe dizia:
- Sabes bem como sou teu amigo. Chora à vontade. Mas sou só teu amigo, nada mais!
E a Cat continuava a chorar, desconsoladamente.
Foram mesmo semanas em que a Cat chorava, tinha crises nervosas, andava com umas olheiras até ao queixo.
Até que... um dia, a Cat veio ter comigo. Parecia outra. Mais leve, ligeira, segura de si.

- Percebi tudo. - disse-me. - Este homem é um manipulador! Aproveitando o meu estado emocional confuso, veio ter comigo para que eu admitisse que estava rrependida de ter terminado o relacionamento.
- E estás, Cat?
- Arrependida? Não! Claro que não. Não soube explicar-lhe que o meu arrependimento tem a ver com a maneira brusca como fiz as coisas. Terminar, sim. Podia era ter sido de outra maneira. Levou-me a tocar nas minhas partes mais obscuras, nas minhas inseguranças. Chorei no colo dele, enquanto ele me garantia que já não sentia nada por mim!
- E tu vês isso agora? Claramente?
- Vejo. Vejo isso e muito mais. Vejo como o final do nosso relacionamento o afectou mais a ele do que a mim, como me deixei manipular por um ar de "cachorrinho abandonado", vejo como esse ar é passivo e cruel, vejo tudo. Vejo como tentou minimizar-me, vejo tudo! E sabes como percebi isto?
- Conta-me que eu quero saber!
- Fui a casa da minha mãe. Fechei-me no escritório e estive horas a ver fotografias da minha infância, da minha adolescência. Falei horas ao telefone com amigos meus, daqueles que me acompanham há anos. Lembrei-me de quem sou, de como sou - já me tinha esquecido. Nem me reconhecia! Fui mesmo ao fundo!
- Até pode ser que tenhas ido, mas tu sempre foste uma sobrevivente.
- Precisamente. Era disso que não me lembrava! Fui ao fundo, pensei que me afogava. Assim que toquei com os pés na lama, empurrei-me para cima, até chegar à tona. Inspirei fundo, todo o ar, o sol, a vida. Ah!! Esta agora, sou eu!!
- E não eras tu que dizias que não sabias nadar bem?
- Era. Mas nado. O Hugo nunca me conheceu! Por isso, nunca me amou!
- E tu, amaste-o?
Ela riu-se, com ar maroto.
- Não, tive uma panca por ele. Mas ele era péssimo na cama! - e continuava a rir.

A Cat saíu dali altiva, senhora de si.
Afinal, sabia nadar, dizia ela!